Tatuador resgata autoestima de mulheres transformando cicatrizes em 'obras de arte' em MG

Tatuador resgata autoestima de mulheres transformando cicatrizes em 'obras de arte' em MG
Foto: Arquivo Pessoal / Lisandra Sampaio

A vida é feita de momentos. Alguns bons, outros nem tanto. Para muitas mulheres, alguns deles são plausíveis de esquecimento, o que as fazem não ter tantos motivos para comemorar neste dia 8 de março. Para ajudar estas mulheres, um projeto de Poços de Caldas (MG) está tatuando cicatrizes destes ‘maus’ momentos que ficaram marcados em suas peles.

Mais de 150 mulheres já foram atendidas pelo projeto ‘RestaurArt’. Com pouco mais de um mês de criação, o projeto é um resgate para a autoestima de mulheres vítimas de automutilação, violência doméstica ou que possuem cicatrizes de doenças degenerativas ou de acidentes graves.

Segundo o idealizador do projeto, 98% das mulheres atendidas são vítimas de automutilação. Além da tatuagem, o projeto oferece acompanhamento psicológico, terapêutico e espiritual para as mulheres.

“Sempre tive vontade de usar o dom que Deus me deu para ajudar as pessoas e percebi que este grupo específico de mulheres precisava de um pouco mais de carinho e atenção com suas marcas. Então decidi criar o projeto ‘RestaurArt’, onde cubro artisticamente estas cicatrizes”, contou o tatuador e idealizador do projeto, Rodrigo Zanão.

A Lisandra Sampaio de 25 anos é uma destas mulheres. Após ser diagnosticada com depressão e vivenciar um relacionamento abusivo, ela encontrou na pele uma forma de se “culpar” pelas dificuldades enfrentadas.

“Eu não tinha maturidade suficiente pra lidar com algumas situações da vida e como as coisas eram frustrantes pra mim, eu me automutilava”, relembrou.

As marcas em seu braço se tornaram a lembrança de um período que ela queria esquecer. Foi então que ela conheceu o projeto.

“Eu resolvi escondê-las porque elas não representam quem sou hoje em dia e também porque falta muita empatia nas pessoas. Já me aconteceu de alguém olhar pra elas, sabendo do que se tratava, e ainda assim sentir necessidade de ‘cutucar a ferida’”, contou.

Segundo Rodrigo, as mulheres costumam tatuar algo que possa ressignificar a cicatriz. Em sua maioria, desenhos que simbolizam renascimento e superação. Por isso, o projeto dá a oportunidade da escolha entre a tatuagem artística ou estética.

A Lisa, como gosta de ser chamada, preferiu a artística e o desenho escolhido foi um personagem de um de seus animes preferidos e que teve importância durante o processo de recuperação.

“Como desde criança sempre gostei muito de animes e jogos, inclusive faço lives todos os dias sobre o assunto, pedi para que ele tatuasse um personagem do anime Cavaleiros do Zodíaco, o cavaleiro Saga de Gêmeos, que também representa meu signo solar. A tatuagem melhorou minha autoestima. Aquelas cicatrizes da minha adolescência eram de uma fase não muito fácil em minha vida e agora eu consegui passar uma ‘borracha’ de vez nisso”.

A cabeleireira Bruna da Silva, 24 anos, não sofreu abusos psicológicos ou físicos causados por um relacionamento abusivo, mas o término de um relacionamento foi um fator determinante para o curso que sua vida viria a tomar.

Este fato somado a outras mudanças pessoais fez com que ela também começasse a se cortar. Assim como para Lisa, mesmo depois de tanto tempo, as cicatrizes eram motivo de questionamento, causando dor ao lembrar-se de um passado não tão feliz.

Com a ajuda do atual companheiro e noivo, ela criou coragem e foi fazer sua 10ª tatuagem.

“Eu pedi pra tatuar algumas flores e um passarinho, representando a liberdade de nunca mais precisar sentir mal vendo as cicatrizes. Além da conquista de ter conseguido superar esta fase na minha vida. A vontade e alegria de fazer foi tão grande que a dor foi suportável”, contou Bruna.

As marcas se tornaram lembranças. Memórias de um momento difícil, mas também da força que ela e todas as mulheres que passaram por algo do tipo possuem.

Para o idealizador do projeto, é poder contribuir para este momento de transformação na vida destas mulheres é muito importante. Para ele, é transformar uma cicatriz de uma batalha a favor da vida em uma obra de arte.

“O projeto tem trabalhado nas nossas vidas assim como na vida das mulheres atendidas. Vimos que muitas de nossas batalhas são irrisórias perto do que estas guerreiras passaram fisicamente e que ainda repercute no psicológico e emocional delas. É uma grande honra poder mudar a vida delas para melhor”.

O projeto

O projeto ‘RestaurArt’ é gratuito. Para fazer parte é necessário entrar em contato com os idealizadores pelas redes sociais ou na rua Paraná, nº400 em Poços de Caldas.

Uma avaliação é realizada na cicatriz e a partir disto é feito o agendamento da tatuagem e do atendimento com as psicólogas. O projeto conta atualmente com dois tatuadores, quatro psicólogas, dois coachs de incentivo e três mentores espirituais.

Segundo o Rodrigo, um dos principais requisitos para quem quer fazer uma tatuagem sobre uma cicatriz é que ela tenha pelo menos 12 meses. Isto porque quanto mais antiga, melhor a aderência da tinta e, consequentemente, da tatuagem.

“Vale lembrar que a tatuagem em cima da cicatriz também pode ser um pouco mais dolorida pelo fato daquela parte cicatrizada da pele ser naturalmente mais sensível”, alertou o tatuador.

Para isso, existe a tatuagem artística e a estética. A tatuagem estética é aquela que camufla em tons da pele as cicatrizes, estrias e manchas. Já as tatuagens artísticas são desenhos elaborados de acordo com a personalidade e o gosto do cliente. Elas são subdivididas em diversos estilos, desde tatuagens tradicionais até temas contemporâneos como tatuagens realistas e 3D.

Fonte: Lara Silva, G1 Sul de Minas — Poços de Caldas, MG