Jovem refaz fotos de formatura após se identificar como não-binário: a pessoa na placa não seria eu

Jovem refaz fotos de formatura após se identificar como não-binário: a pessoa na placa não seria eu
Jovem refaz fotos de formatura após se identificar como não-binário; "quem apareceria na placa não seria eu" — Foto: Arquivo Pessoal/Jamil Ribeiro

O estudante de psicologia Jamil Ribeiro, de 25 anos, passou a se identificar como trans não-binário em março de 2021. Depois desse processo, Jamil decidiu refazer as fotos da sua formatura porque, segundo ele, "me dei conta de que quem apareceria na placa não seria eu".

Pessoas de gênero não-binário são aquelas que não se percebem como um gênero exclusivamente. Ou seja, sua identidade de gênero e expressão de gênero não são limitadas ao masculino e feminino.

Jamil contou ao G1 que em fevereiro de 2020, como tradicionalmente acontece no fim de uma graduação, fez as fotos para a placa de formatura com a turma. Porém, pouco mais de um ano depois, tinha outra aparência e nome.

"Eu me identifiquei como não-binário em março de 2021 e aí a turma quis decidir a colação de grau, se ia ou não ter, se iam cancelar, mas a certeza é que a gente ia fazer a placa e os convites e então me dei conta de que quem ia aparecer na placa era a foto do começo do ano, não seria eu. Fiquei muito triste porque ia aparecer meu nome social, mas eu ia aparecer maquiado, com cabelo grande e diferente do que sou hoje, com um macacão rosa... um pesadelo mesmo", disse.

Jamil é produtor de conteúdo nas redes sociais e, após assumir sua identidade de gênero, passou a falar mais sobre sua vivência. Segundo ele, depois de muita luta contra a transfobia, violência específica sofrida por pessoas trans, e exigir a mudança de seu nome em documentos oficiais e nos documentos da universidade, não poderia concluir o curso com uma imagem que não o representava.

Assim, Jamil entendeu que deveria refazer suas fotos de formatura. Sua família e amigos do curso o ajudaram.

"Meus pais me ajudaram, entraram em contato com a empresa que fez as fotos para pagar novamente só esse ensaio. Expliquei meu caso para a empresa, eles entenderam, marcaram no mesmo lugar só comigo e fizeram o cenário de novo. Foram muito empáticos. Um colega da turma, que também é LGBT, me emprestou a roupa já que não dava tempo de fazer a camisa masculina. Serviu direitinho, ficou perfeita", contou o jovem.

As fotos que Jamil refez foram as individuais, as fotos para a placa da turma e as que estarão no convite da formatura.

A fotografia com a turma inteira não pôde ser refeita, e ficará registrada a imagem antiga de Jamil. Mas o detalhe não incomoda o jovem.

"O pessoal da sala ainda perguntou o que eu ia escolher, se era vestido, macacão ou roupa de menino. E eu escolhi macacão, mandei fazer. Agora que refiz as fotos, meu nome social certo está lá e as fotos individuais também, mas a foto da turma, que eu estou bem no centro, ainda estou de macacão rosa e maquiado. Achei legal, porque vão me procurar lá e não vão encontrar", disse sorrindo.

Batalha pelo nome social

Durante o curso, Jamil teve que lutar para ter seu nome correto escrito nos registros da Universidade Estadual do Piauí (Uespi), instituição onde cursa psicologia. Ele contou que foram muitas idas e vindas na universidade para conseguir alterar seus dados, mesmo quando seus documentos oficiais já haviam sido retificados.

"Em 2020 eles mudaram meu nome e colocaram o certo, Jamil Ribeiro, mas no começo desse ano [2021], quando o semestre começou, meu e-mail institucional estava com meu nome antigo. Aí eu tranquei o curso, porque eu não ia participar das aulas sendo tratado por um nome registrado lá que não é mais o meu", explicou Jamil.

Para Jamil, a demora e erros nos seus dados aconteceram porque a lei ainda não é rígida para casos de transfobia. A retificação só veio após ameaças de processar a instituição.

"Eu vou colar grau em outubro. Quando refiz as fotos, estava com o curso trancado porque eu me recusei a voltar para a Uespi em pleno 10º período porque eles não estavam acatando meu nome social, eu estava há meses pedindo. Só atenderam meu pedido depois que ameacei levar o caso à Justiça", explicou.

O G1 Piauí entrou em contato com a Uespi e aguarda posicionamento da instituição.

O descerramento da placa, marco do evento de formatura da turma de psicologia de Jamil, aconteceu no dia 19 de agosto. Jamil pode, enfim, ver seu nome social na placa registrando sua trajetória pela universidade.

Fonte: Lívia Ferreira*, G1 PI