'É muito sofrimento', diz viúva que acusa PMs de matarem mototaxista na Cidade de Deus

'É muito sofrimento', diz viúva que acusa PMs de matarem mototaxista na Cidade de Deus
Miriam segura a cápsula da bala que, segundo ela, matou seu marido na Cidade de Deus Foto: Fabiano Rocha / Agência O Globo

Ao chegar ao Instituto Médico Legal, na Leopoldina, região central do Rio, na manhã desta quarta-feira, Miriam dos Santos, de 49 anos, fez um desabafo sobre a morte de seu marido. O mototaxista Edvaldo Viana, de 42 anos, foi baleado na noite desta terça-feira, durante uma abordagem por parte de policiais do 18º BPM (Jacarepaguá) na Rua Edgard Werneck, na Cidade de Deus, na Zona Oeste do Rio. A pessoa que estava na garupa também morreu. A Corregedoria da PM apura a ação. O fuzil de um dos agentes foi recolhido e passará por uma perícia.

— Eu cheguei lá e ele estava morto. É muito sofrimento. Esses homens vão para a rua para matar inocente. Eles só matam inocente. No mesmo local onde há seis meses mataram outro inocente — disse Miriam.

Ela, que acusa os policiais militares de não terem dado qualquer ajuda, mostrou uma das cápsulas da bala que afirma ter matado Edvaldo:

— Eram duas (cápsulas). Mas no desespero não sei onde a outra foi parar.

Miriam disse que o marido morava na Gardênia Azul, região próxima à Cidade de Deus, e garantiu que a moto dele era legal.

— A moto do meu marido não é moto roubada. É moto comprada com suor — afirmou.

A mulher contou ainda que, ao chegar ao local, foi comunidade com frieza por um PM sobre a morte de Edvaldo:

— Eu cheguei e ele ainda estava lá. Falou: "meus sentimentos". Eu falei: "meu marido está morto?". Ele não rodeou nem nada.

Dois 'gansos' morreram

Enteado de Edvaldo, Paulo Henrique dos Santos Duarte disse que os PMs se referiram ao mototaxista e à outra pessoa morta como "ganso" — termo que muitos policiais usam para se referir a suspeitos.

— Chegamos lá, tinha algumas viaturas, perguntamos e falaram: os dois "gansos" já morreram e já levaram. Falei: não é "ganso", não — contou ele.

Paulo disse que após alguma dificuldade conseguiu atravessar a rua. E logo viu o sangue no chão. O rapaz relatou que algumas pessoas afirmaram que seu padrastro havia sido morto por PMs depois de fazer uma bandalha no trânsito:

— Um pessoal que estava no lava-jato falou: colega, seu padrasto parou a moto e eles, de dentro do carro, dispararam, seu padrasto caiu e eles desceram do carro e atiraram no outro. Todo mundo saiu falando a mesma coisa: que ele simplesmente foi fazer a bandalha onde todo mundo faz e sempre acontece isso. Seis meses atrás foi com outro rapaz. Foi mais um que entrou para a estatística. E agora aconteceu com meu padrasto.

A mulher de Paulo, que está grávida de cinco meses, foi ao local do crime e passou mal. Ele contou ter sido impedido por policiais de ir até onde ela estava.

— Não deixaram atravessar (a rua). Minha esposa foi pra casa e a levei para a (maternidade) Leila Diniz — disse.

Corregedoria apura ação

Em nota, a Polícia Militar informou que o secretário da corporação, coronel Rogério Figueredo de Lacerda, determinou que a Corregedoria da PM apure a ação ocorrida na Rua Edgard Werneck, em Jacarepaguá. De acordo com a corporação, "os policiais do 18ºBPM (Jacarepaguá) que participaram da ocorrência foram ouvidos na Delegacia de Homicídios da Capital e um fuzil da equipe foi recolhido para perícia".

Após as mortes, moradores realizaram um protesto e tentaram bloquear ruas. Homens do Batalhão de Polícia de Choque (BPChq) atuaram junto às equipes do 18º BPM para estabilizar a região.

Outra morte em janeiro

Em janeiro deste ano, Marcelo Guimarães, de 38 anos, passava de moto pela Rua Edgard Werneck quando foi atingido por um tiro e morreu. Na época, a Polícia Militar afirmou que havia um confronto no local — versão negada por moradores da Cidade de Deus.

Também morador da Gardênia Azul, Marcelo foi descrito por amigos como um homem trabalhador e honesto. Ele trabalhava numa marmoraria e estava de moto quando foi baleado.

Fonte: Extra/Globo.com